novembro 21, 2007

abraço

Disse-te segredos ao ouvido. Deixei-me ficar.
Deliciei-me com o teu cheiro, a tua pele.
Os minutos fizeram-se séculos. O mundo envolveu-nos, sem nos tocar.
Eu devorei o momento em calmo e profundo transe.
No teu corpo encontrei a minha alma.
E sorrindo, adormeci abraçando-te para além dos meus braços.

novembro 17, 2007

o comboio

O som do comboio tinha algo de libertador que não conseguia explicar. Como se o som da sua passagem pelos carris, e o apito lançado para o ar, abafasse a necessidade que tinha de gritar, pelo simples facto de que se o fizesse ninguém o poder ouvir.

Também não sabia explicar as inquietudes que lhe invadiam a alma de quando a quando. Pequenos medos que tinha acumulado pela sua vida. Pequenos rancores.

O que o atormentava de verdade, não eram os desassossegos, era a inaptidão de mudar, de cortar o ciclo.

Muitas vezes tinha tido a sensação de que o universo se divertia atormentando-o com pequenos muros e escaladas, sabotagens de diferentes graus. Às vezes para o levar à irritação, outras ao desespero, outras ainda ao desgaste e à exaustão.

A incapacidade de sair de tal enrodilhado de pequenas dores era muitas vezes atribuído a essa perseguição cósmica.

Estava mesmo em querer que era tal a força do universo, que sem ter dado por isso, lhe enraizara uma espécie de vírus, que circulava livremente entre a sua mente e a sua alma e lhe condicionava as atitudes e decisões, sabotando-o mais do que uma vez.

Nos últimos tempos, dava, no entanto, consigo a pensar que talvez, talvez, grande parte da sua inacção tivesse apenas origem em si e tudo o resto eram apenas coincidências. E isso sim era verdadeiramente assustador.

fizeram-se ao mar

As palavras rumaram num barco e não estão cá. Fizeram-se ao mar. Partiram com névoa e sem despedidas.

Eu fiquei. E todos os dias vejo o mar desejando o seu regresso.
Na sua ausência, não há lugar a pensamentos. Apenas emoções, sentimentos, que sem som, nem letras, deambulam nas minhas memórias de imagens desgastadas, pouco nítidas.

Vivo um silêncio gordo, preenchido, pleno de coisas por dizer, mas adormecido pela ausência das palavras.
E atravesso dias e noites até ao seu regresso.

novembro 11, 2007

não olhar para trás

Não olhar para trás. Tinha prometido a si mesma não olhar para trás.
Aquele mundo ficava ali. Encerrado numa cidade, numa rua, numa vida que já não queria viver.

Na mala pouca coisa. Não queria recordações.
Aguardavam-na novas roupas, novos livros, novos confortos.
Seria outra pessoa. Seria ela mesma.

A força e a vontade de partir tinham-se encontrado naquele momento.
Não havia tempo para despedidas.

estou aqui

Soube por acaso. Fez-me relembrar um passado que de tão antigo já quase não dói, apenas é saudade. Sei o que custa.

Mesmo sem estares ao pé de mim embalei-te e abracei-te.
Estou aqui.

Para M.

prenúncio de amizade

Fazes-me companhia.
No mundo das letras, és mais do que imaginas.

Às vezes,
és mão que se estende do outro lado.
és certeza que o mundo é mais do que a minha alma alcança nos seus momentos escuros.

Estás distante, és presente
e trazes prenúncio de amizade.

Para L.

novembro 07, 2007

serra

Imensidão que acompanha,
sons de quase silêncio,
pequenos aromas dispersos.

Porto de abrigo enraizado,
traços da minha existência.